Fernanda Lapa! Presente!

Actriz, lutadora, generosa, encenadora, exigente, combativa, mãe, arrebatadora, mulher, solidária, resistente, moderna, desafiante, talentosa, íntegra, leal, honesta, professora, comunista, empreendedora, militante cívica, parceira, interventiva, avó, inconformada.

Partiu, em 6 de Agosto passado, precisamente no ano das comemorações do Centenário de Bernardo Santareno, de que foi incansável e importante coordenadora, impulsionando múltiplos eventos marcantes por todo o país, assinalando a grandiosidade do reconhecido dramaturgo português.

Estava ligada ao dramaturgo por uma amizade profunda que nasceu do conselho que o Dr. António Martinho do Rosário lhe deu, em consulta de psicologia, após testes psicotécnicos não conclusivos: “Podes fazer o que quiseres, mas o teatro tem tudo a ver contigo.”

Dedicou quase 60 anos da sua vida ao teatro, em vertentes variadas, peças de teatro, óperas, teatro-dança, quer em palco, quer no cinema ou na televisão, criando a Escola de Mulheres-Oficina de Teatro, em 1995, em colaboração com Isabel Medina, projecto que acarinhou, privilegiando a criação feminina no teatro.

Recebeu o Globo de Ouro em 2005, pela produção A mais Velha Profissão do Mundo e foi distinguida, no mesmo ano, com a Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura.

No Dia do Teatro em 2020 produziu a mensagem habitual, que designou “Viva o Teatro, os seus agentes, o seu público”.

Palavra à Fernanda Lapa:

“Faço um trabalho rigoroso e muito interessado no texto e nos seus intérpretes. Quero que o meu teatro não seja uma torre de marfim, desligado da vida e dos grandes temas que dominam a parte da humanidade que melhor conheço. Daí, a problemática da condição feminina me interessar muito e, sempre que descubro um texto que reflecte de forma criativa sobre esse tema, aí estou eu a tentar pô-lo em cena.” (Entrevista conduzida por Maria Helena Serôdio e Sebastiana Fadda inserida em Sinais de Cena de Maio de 2006).

“Há a ideia de que nos lamentamos. Que somos subsídio-dependentes. Mas quem acha isso está perfeitamente fora da realidade e normalmente é dito por pessoas que vivem muito bem e que têm ordenados fixos e 13º e 14º mês. Isto de nos lamentarmos muito… é o direito a reivindicar o direito à cultura e à dignidade e à cultura para todos. E para que haja cultura e artes não podem desaparecer os artistas. Aliás, este país não é para artistas, nem para velhos, nem para novos. Neste momento estão a saltar cá para fora todas as fragilidades que ao longo dos anos este país tem escondido.” (entrevista ao Semanário “Expresso” em Maio de 2020).

A Seara Nova teve a honra de contar com a sua colaboração no número da Primavera de 2020, em artigo que intitulou Bernardo Santareno – As suas Máscaras ou Alter Egos, deixando no final um apelo “Mas passados dois meses deu-se a Revolução dos Cravos. O Bernardo acreditou que tudo seria possível, mas foi perdendo a esperança. Morreu triste. Este é o seu Centenário. Comemoremo-lo.”