Poesia – “Mal talhada para a luz”
Mal talhada para a luz,
para entender a luz,
afasto-me dos rostos,
das casas devolutas
corrompidas por uma roseira,
uma rosa única
voltada para o céu
com o nariz em sangue.
Precisaria de um tempo inteiro intermédio
espalhado pelo chão
para entender o que de luz se houver desfeito,
esclarecido.
Um tempo sem cor
de olhos nem memória
para entender a luz,
o seu zumbir,
a beleza arterial de quem a sofre –
animais de carga, tolos, funcionários
todo o dia em pé
impelidos a um sono equívoco.
Precisaria de arder numa fotografia.
De um destino torpe.
Uma saturação de línguas sobre a ferida
para me salvar.
In Tão Bela Como Qualquer Rapaz, Língua Morta, 2017
(Prémio Autores 2018 para Melhor Livro de Poesia da SPA)