Nota de Leitura – “Lopes-Graça, o artista empenhado, ou a música para além dos sons!”
Embora felizmente já existam diversos trabalhos sobre a obra e a vida de Lopes-Graça, nomeadamente a obra: «O Essencial sobre Lopes-Graça» do musicólogo Mário Vieira de Carvalho editada pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, a obra «Em torno de Lopes-Graça; Pensamento – Resistência – Criação» da autoria de Fausto Neves, pianista, docente na Universidade de Aveiro, doutorado em Música (Performance) com a tese “Imagem Estética e Expectativa Musical na obra de Fernando Lopes-Graça”, publicada recentemente pela «Página a Página», vem enriquecer, pela forma profusamente documentada e largamente reflectida como aborda a sua vida e obra, o quadro do que já tem sido escrito em torno deste grande vulto da nossa música e da nossa cultura.
O autor, acompanhando o seu texto com citações e declarações dos mais diversos artistas e teóricos da música e mesmo de cientistas da área das neurociências, dá-nos a conhecer um Lopes-Graça que não tendo especialização científica naquela área, já defendia convictamente a importância da música na formação do indivíduo, da sua sensibilidade, da sua consciência e, consequentemente, na elevação da qualidade das relações sociais, portanto no processo de construção de uma sociedade melhor, mais culta e desenvolvida.
Com o propósito de clarificar a muito reiterada ideia, quanto à menor atratividade versus dificuldade, da sua música, apresenta algumas conclusões, que retirou de doze entrevistas realizadas a personalidades próximas de Lopes-Graça, desmistificando conceitos errados, que muitas vezes não são na realidade mais que preconceitos ideológico-políticos, que afetam certos juízos pretensamente fundados somente em conceitos/valores de natureza artística.
No último capítulo do livro o autor debruça-se sobre as questões de natureza filosófico-política que enformaram quer a vida, quer a obra de Lopes-Graça, ou seja enquanto cidadão empenhado na luta social e política que desenvolveu com enorme coragem e abnegação e ao serviço da qual colocou a sua grande arte.
De assinalar ainda, quer por testemunhos do próprio autor, quer de extratos de escritos do artista – Lopes-Graça produziu escritos diversos de elevado recorte literário – quer de personalidades diversas, da cultura à política, o retrato que é feito da vida social, cultural e política de Portugal, e até do mundo, durante o período da sua vida, 1906 a 1994.
Uma obra que, para além do que nos dá em matéria de reflexão sobre a importância da música – da erudita à popular – na formação do indivíduo e, que em consequência, na vida e qualidade da sociedade, é uma justa homenagem – que nunca será demais fazer – à postura vertical, ética, que não transige quando estão em causa a defesa e prática dos mais elevados valores como a liberdade, a fraternidade e a solidariedade, que Lopes-Graça abraçou e praticou ao longo da sua vida.