Efemérides 2021 – Nascidos com a Seara
Arquimedes da Silva Santos
Arquimedes da Silva Santos, especialista em neuropsiquiatria infantil, poeta, escritor, ensaísta, pioneiro da Educação pela Arte em Portugal e um destacado militante do movimento neorrealista português, nasceu na Póvoa de Santa Iria em 1921. Militante antifascista desde a juventude participa na campanha de Norton de Matos e é preso pela PIDE em Julho de 1949. É julgado no Tribunal Plenário e cumpre pena no Aljube e em Caxias até Dezembro de 1952.
A sua elevada competência leva-o a ser convidado para assistente no Centro de Investigação Pedagógica do Instituto Gulbenkian de Ciências. Colabora com a Escola Superior de Educação pela Arte do Conservatório Nacional de Lisboa e com a Escola Superior de Dança.
Em 1998, é agraciado com a comenda da Ordem do Infante Dom Henrique, em 2001 com a Grã-Cruz da Ordem da Instrução Pública e em 2018 com o título de doutor Honoris Causa pela Universidade de Lisboa.
Tendo privado com poetas, artistas e escritores, como Bernardo Santareno, Garcez da Silva, Júlio Graça, Bona da Silva, Fernando Namora, Fernando Lopes-Graça, Eduardo Lourenço, João José Cochofel e Alves Redol, entre outros, honrou a memória deste último, com quem mantivera grandes laços de amizade e cumplicidade, lutando pela criação de um Centro de Documentação e Investigação do Neorrealismo. É, em 1988, membro fundador da Comissão Instaladora do Museu do Neorrealismo e, dez anos depois, vice-presidente da Assembleia-Geral da Associação Promotora do museu.
Na Seara Nova, para além da sua colaboração poética, que decorre entre os anos 1944-47, publica, no nº 951 de Novembro de 1945, os versos do Hino do Movimento de Unidade Democrática com música de Fernando Lopes-Graça.
Faleceu a 8 de Dezembro de 2019.
Maria Judite de Carvalho
Nasceu em Lisboa a 18 de Setembro de 1921.
Em 1949, na revista Eva, de Lisboa, publica o seu primeiro texto, a novela, O Campo de Mimosas.
É de 1959, dez anos depois, o seu primeiro livro, Tanta Gente, Mariana.
Segue-se, em 1961, As Palavras Poupadas que lhe valeu o Prémio Camilo Castelo Branco, da Sociedade Portuguesa de Escritores.
Em 1991 volta a ver um trabalho seu premiado, Este Tempo, Prémio de Crónica da Associação Portuguesa de Escritores.
Em 1995 publica o seu último livro, Seta Despedida, que lhe valeu quatro prémios: da APE, do PEN Clube, da Associação Internacional de Críticos Literários e da revista Máxima. Em 1998, ano da sua morte, foi-lhe atribuído a título póstumo o Prémio Vergílio Ferreira.
Escritora, jornalista/cronista, dela disse Agustina Bessa-Luís ser a “flor discreta da literatura portuguesa”.
Em 1968 entra para o Diário de Lisboa. Colabora ainda no O Século e no República, entre 1968 e 1975. Colabora também no Diário Popular.
De 1968 a 72, na secção “Rectângulos da Vida” do Diário de Lisboa, escreveu perto de 400 crónicas. Ainda na forma de crónicas, também no Diário de Lisboa, mas com o pseudónimo de Emília Bravo, escreveu entre 1971 e 74.
Sobre ela escreveu, em 1989, Carlos Reis:
… dotada de um extraordinário talento de contista, associado à singular representação de um mundo que, sobretudo nos seus contos, se dá a conhecer Maria Judite de Carvalho configura, com precisão e com equilíbrio no tratamento das categorias da narrativa, um pequeno universo que, cabendo todo nas apertadas fronteiras de intensos e breves relatos, é capaz de transcender essas fronteiras, prolongando-se para além delas. …
No mundo dos seus contos, das suas novelas e dos seus romances, como no das suas admiráveis crónicas, perpassam pequenas ambições e grandes frustrações, solidões, desencantos calados, tudo projetado num cenário que, sendo marcadamente feminino, é atravessado por um calor humano inesquecível.
Faleceu a 18 de Janeiro de 1998.
Natália Nunes
Nasceu em Lisboa a 18 de Novembro de 1921.
Romancista, dramaturga, ensaísta e tradutora, destacou-se como contista tendo construído, nesta disciplina, uma das mais vastas obras na literatura portuguesa.
Em 1952, estreia-se com Horas Vivas: Memórias da Minha Infância, a que se sucedeu, em 1955, Autobiografia de uma Mulher Romântica.
Como romancista, a qualidade da sua escrita e a natureza das suas preocupações culturais e sociais poderão ser aferidas, entre outros, em romances como: Autobiografia de Uma Mulher Romântica e Vénus Turbulenta, o seu último romance, de 1997. Enquanto contista, a sua mestria poderá ser apreciada em títulos como Ao Menos um Hipopótamo (1967), As Velhas Senhoras e Outros Contos (1992) ou Louca por Sapatos (1996).
De referir também, no campo da escrita ensaística, os seus Estudos sobre a obra de ficção de Carlos de Oliveira – A Ressureição das Florestas (1997), editado pela Imprensa Nacional – Casa da Moeda.
Membro da direcção da Sociedade Portuguesa de Escritores durante o regime fascista foi também uma activa militante da resistência antifascista.
De assinalar a sua colaboração com a Seara Nova e também com a Vértice.
Faleceu a 13 de Fevereiro de 2018.
Orlando Gonçalves
Nascido a 15 de Agosto de 1921, na Ajuda, em Lisboa, Orlando Gonçalves foi pela primeira vez preso pela Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE), em 1943, acusado de pertencer ao Socorro Vermelho Internacional.
Saído da prisão em 1944, Orlando Gonçalves retoma a sua intervenção cívica na esfera pública, acompanhando a actividade do Movimento de Unidade Nacional Antifascista (MUNAF) e aderindo, em 1945, ao Movimento de Unidade Democrática (MUD), no decurso do processo em que a oposição exigia a criação de partidos e a participação nas eleições legislativas.
Na década de 50, dirigiu em 1951 o programa radiofónico quinzenal «Literatura e Artes», que ia para o ar na Rádio Peninsular e que acabou encerrado por pressão da PIDE. Participou em 1956 na comissão organizadora da Sociedade Portuguesa de Escritores e, em 1958, na campanha eleitoral de Arlindo Vicente à Presidência da República.
Desde que assumiu, em 1963, a direcção do Notícias da Amadora, os Serviços de Censura, apesar de ser com ele que os censores, o Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo (SNI) e, posteriormente, a Secretaria de Estado da Informação e Turismo (SEIT) tratavam de todas as questões que ao jornal diziam respeito, negaram-lhe sempre que constasse como proprietário, editor e director do Notícias da Amadora.
No seu primeiro editorial, em 26 de Junho de 1963, Orlando Gonçalves anunciou o objectivo de editar um jornal que servisse o público tendo a verdade como postulado e a razão e a justiça seriam o seu norte. O jornal constituiu a partir de então a sua principal forma de intervenção política. A escrita, enquanto informação, deveria disseminar conhecimento que se tornasse útil aos leitores.
Passados sete anos, já com oficinas gráficas próprias, o jornal passou a ter expansão e distribuição nacional.
Paquete de Oliveira na sua tese de doutoramento, com base num estudo à imprensa censurada que realizou em Fevereiro de 1973, considerou o Notícias da Amadora como um de três jornais «nitidamente demarcados como os únicos jornais portugueses de “oposição” ao governo» e um de dois casos notáveis da «imprensa “de resistência”» ao salazarismo.
Da sua acção política destaca-se a participação na Comissão Democrática Eleitoral (CDE), em 1969 e 1973, e no 3º Congresso da Oposição Democrática de Aveiro, em 1973.
A sua resistência à ditadura – fazendo imprimir nas oficinas gráficas obras de várias editoras ou dos sindicatos fundadores da estrutura da Intersindical —, determinaram a sua prisão em Caxias a 18 de Abril de 1974, donde é libertado por acção do Movimento das Forças Armadas em 25 de Abril de 1974.
Faleceu a 8 de Novembro de 1994.
Victor de Sá
Historiador, político, militante antifascista, nasce em Barcelos a 14 de Outubro de 1921.
Em 1937 inicia-se na escrita publicando artigos no Correio do Minho ao mesmo tempo que tenta criar uma biblioteca de empréstimo no liceu, iniciativa imediatamente travada pelo reitor. Assim começa o que viria a ser uma vida de intensa actividade intelectual, científica e política.
Em 1942, aos 21 anos de idade, antes das Bibliotecas Itinerantes da Gulbenkian, lança as “Bibliotecas Móveis”.
Funda, com Salgado Zenha, Armando Bacelar e Flávio Martins entre outros, o «núcleo de resistência e de formação ideológica».
É detido pela PIDE a 2 de Junho de 1947 e conduzido às suas instalações no Porto, onde sem culpa formada, permanece até Julho, ao lado de Francisco Salgado Zenha, Armando Bacelar, do músico José Bacelar e de outros jovens oposicionistas bracarenses. Quando é posto, sem explicações, em liberdade, retoma de imediato o trabalho e consegue finalmente abrir a Livraria Victor, no dia 13 de Julho de 1947.
Sobre a sua livraria disse António M. Santos da Cunha ao Chefe de Gabinete do Ministro do Interior: para os fins que V. Ex. achar por convenientes tenho a honra de informar que a Livraria Victor, desta cidade, propriedade do conhecido agitador Dr. Victor de Sá, tem tido à venda três obras de propaganda de doutrina considerada subversiva que grande repercussão e mal têm causado entre o público, sobretudo entre o clero. As obras a que nos referimos possuem os seguintes títulos: “De Humberto Delgado a Marcelo Caetano”, “Queremos ser livres” e “Padre Camilo Torres”, sacerdote assassinado na Argentina (Comissão do Livro Negro do Fascismo, 1980: 236).
Participou no Movimento de Unidade Democrática, na candidatura de Norton de Matos, de Humberto Delgado e em todas as acções da oposição democrática. Desta intensa actividade resultou a prisão pela PIDE por oito vezes (em 1947, 49, 50, 55, 58, 60, 62 e 69) e a proibição de leccionar no ensino público até 1974.
Tendo concorrido a um lugar de professor na Escola Comercial e Industrial de Braga e sendo a sua nomeação publicada em Diário do Governo foi apesar disso impedido de tomar posse.
É significativa a sua colaboração na Seara Nova que se inicia no nº 1345 de Novembro de 1957 com o artigo Pedro de Amorim Viana e os preconceitos eleitorais. Colaboração que se prolonga até 1990, ao longo de mais vinte e quatro números. O ensaio Amorim Viana e Proudhon, base da sua tese de licenciatura em Coimbra, em 1959, recebeu, nesse mesmo ano, o «Prémio Rodrigues Sampaio» e, no ano seguinte, o «Prémio Francisco A. Correia». Nesse mesmo ano a Seara Nova edita uma publicação com o referido texto. Em 1969 é editado, também pela Seara Nova, a sua tese de doutoramento, na Sorbonne, A crise do liberalismo e as primeiras manifestações das ideias socialistas em Portugal (1820-1852) que tem, no ano seguinte, uma segunda edição num total, extraordinário para obras desta natureza, de 14.000 exemplares. Em 1979 é ainda publicada uma 3º edição pela Livros Horizonte. Publica ainda na revista Vértice e no jornal República.
Importante para a compreensão do mundo operário é a sua obra, publicada em 1991, Roteiro da Imprensa Operária e Sindical, 1836-1986.
Foi agraciado com a Comenda da Ordem da Liberdade em 1990. Em 1991, assume o papel de mecenas para a criação do Prémio de História Contemporânea que hoje se chama Prémio Victor Sá de História Contemporânea.
Faleceu a 31 de Dezembro de 2003.