SANTARÉM NO III CONGRESSO DA OPOSIÇÃO DEMOCRÁTICA
Realizou-se, em Aveiro, no mês de Abril de 1973, cerca de um ano antes da madrugada libertadora do 25 de Abril de 1974, o III Congresso, já não Republicano, como os dois anteriores, mas com a designação de Oposição Democrática, não por iniciativa da Comissão Organizadora mas por sugestão do Governador Civil, certamente por indicações superiores, para dar mostras falsas, internacionalmente, que havia liberdade em Portugal, na participação da vida política.
Desde o princípio desse ano de 1973 que se passaram a realizar com regularidade reuniões preparatórias, com as possíveis representações distritais, a nível nacional.
Santarém esteve sempre presente, nessas reuniões preparatórias, sob o dinamismo de Humberto Lopes, resistente com 8 anos de prisão, que se fazia acompanhar de democratas com espírito participativo na Oposição Democrática, designadamente de Santarém e do concelho vizinho de Alpiarça, alfobre de manancial de homens de luta permanente.
Integrei esse grupo, para além de Álvaro Brasileiro, Manuel Mendes Colhe (ambos de Alpiarça) e José Manuel Raimundo, Dilina Baudouin e José Manuel Sampaio, de Almeirim, entre outros.
De entre as várias teses apresentadas, refiro uma, denominada “As Condições dos assalariados, sua combatividade e a Democracia” – Grupo de Camponeses de Alpiarça, em cuja elaboração participei com o Blasco Hugo Fernandes, da área de agronomia. Tese que foi resultado de várias discussões havidas, ao longo de reuniões coletivas realizadas com numerosos camponeses/trabalhadores agrícolas de Alpiarça, quer em Alpiarça, quer nos campos de Vila Franca de Xira, onde passavam cerca de 6 meses nos meloais, em terras da Companhia das Lezírias.
Destaco as Conclusões, aprovadas no Congresso de Aveiro de 1973 (Tese nº 8 da Secção B – Estrutura e Transformação das Relações de Trabalho, 3º – Análise de Condições Concretas de Prestação de Trabalho, Edição da Comissão Executiva):
“O regime actual é defensor dos grandes agrários. É um regime de terror. Só a Democracia serve as causas dos trabalhadores.
- Só a abolição das estruturas fascistas e a legislação de estruturas Democráticas poderá acabar com a perseguição dos trabalhadores e defender os seus direitos.
- Sendo as condições dos trabalhadores más em todos os aspectos, como por exemplo: salários, horários, assistência, alojamento e higiene, segurança e deslocações, só um Programa Democrático poderá devidamente estipular condições humanas que satisfaçam estes trabalhadores. Com salários que façam face ao custo de vida, pagamento do 7º dia, férias pagas, horas extraordinárias pagas a 100%, horário de 35 horas semanais, assistência médica em quantidade e qualidade, assistência aos filhos que seja suficiente mais ou menos ao nível de salários, reforma por invalidez na idade de 55 anos, que corresponda ao salário auferido são estas as necessidades dos trabalhadores agrícolas.
- Há discriminação em relação à mulher especialmente nos salários onde chega a ganhar metade do homem a fazer o mesmo trabalho dando-se este caso em certas regiões. Só com o aumento de salários à mulher e respetivo nivelamento como salário dos homens no mesmo trabalho se poderá prestar verdadeira justiça Democrática. Melhorar a situação dos trabalhadores para que os seus filhos não sofram os efeitos das condições miseráveis sofridas pelos pais.
- Acabar como domínio dos povos das colónias, isto é, com a guerra injusta, que lá se trava, visto estes povos terem o direito que nós exigimos a nós próprios, que é o direito à auto-determinação sem discriminação.
- Visto o desemprego, emigração e migração trazer aos trabalhadores e ao povo em geral graves consequências.
Defendemos por isso a ocupação de todos os trabalhadores de acordo com um verdadeiro desenvolvimento económico, caso por exemplo da reforma agrária, desenvolvimento da indústria transformadora, etc.
Desta maneira queremos que os trabalhadores do campo tenham um nível de vida igual ao dos países desenvolvidos.”
Na sessão de abertura do Congresso usou da palavra Manuel Mendes Colhe, de Alpiarça, um dos participantes na Tese acima referida.
Na carga policial desferida sobre os participantes na romagem ao cemitério para homenagem a Mário Sacramento, a delegação de Santarém foi das mais atingidas por se situar na cauda, tendo Humberto Lopes sofrido uma coronhada num braço e a Dilina Baudouin uma mordidela de um cão.
Humberto Lopes, Álvaro Favas Brasileiro, José Manuel Bento Sampaio, José Alves Pereira e João Luiz Madeira Lopes, participantes, por Santarém no Congresso, viriam a integrar a Lista candidata pelo distrito de Santarém às eleições à Assembleia Nacional em Outubro desse mesmo ano de 1973: CDE (Comissão Democrática Eleitoral).